quarta-feira, 28 de julho de 2010

Gabriela Duarte abandona o jeito certinho com papel de insaciável


Trabalhar, casar, constituir família e viver uma vida estável foi uma conquista feita em cima de terapia e determinação para Gabriela Duarte. Mas, quem diria, a imagem de uma pessoa equilibrada acabou pesando contra a atriz na hora de ser escalada para determinados papéis. Tanto que a filha da "namoradinha do Brasil", Regina Duarte, mal acreditou quando leu a descrição da atirada Jéssica de Passione. Acostumada a encarnar mocinhas certinhas e recheadas de valores morais, Gabriela decidiu apostar todas as suas fichas na divertida dondoca que interpreta na história de Sílvio de Abreu. "Autor não dá presente. Ele aposta ou não em você. Fiquei feliz por ver que alguém confia em mim para interpretar um papel tão distante das minhas características", avaliou. Mas Gabriela quase perdeu a oportunidade: ela estava tentando engravidar quando recebeu a sinopse do folhetim. Um outro filho, agora, vai precisar esperar bastante. "Já que não rolou a tempo, quero tentar colher os possíveis frutos que a Jéssica possa me trazer depois que a novela acabar", explicou ela, que espera ser lembrada por outros autores e diretores para interpretar papéis mais ousados. "Ator tem de experimentar coisas novas. Não é bom aparecer sempre do mesmo jeito no vídeo", afirmou.

Jéssica é uma personagem fogosa. Você sentiu dificuldades para construir um papel com esse traço?
Existiu uma dificuldade inicial. Mas o legal da comédia é que ela possibilita muita coisa. É um gênero libertador e está me deixando muito feliz nesse momento. São vários caminhos possíveis. Queria fazer uma Jéssica que pudesse existir, não uma caricatura louca e excêntrica. Já que é uma personagem tão boa, distante de tudo que já fiz, não iria para o lado mais fácil.

Como foi esse processo de construção?
Fiz um trabalho com a Rosella Terranova (preparadora de elenco da Globo). Eu e o Bruno (Gagliasso) também conversamos bastante, trocamos várias ideias. O que eu achei bem bacana nessa novela é que só exibiram a primeira cena que gravei algumas semanas depois da estreia. Fiquei feliz porque pude ver que a Jéssica já existia em mim ali. Também tive aulas de clown com o Fernando Vieira. Era algo que eu já queria fazer, não só pelo gancho da comédia de Passione. É uma atividade que pega o seu ego, esmigalha e joga na lata do lixo. Liberta você. Ajudou muito.

O fato de ser uma personagem mais sexualizada chegou a mexer com a sua vaidade?
Não achei que precisasse me preocupar com o corpo. Penso até que não combina com a Jéssica. Claro que não queria me detonar, mas não vejo essa menina muito magra e malhada. Emagreci um pouquinho depois que os trabalhos começaram, só que em função da rotina corrida mesmo. Não foi nada planejado.

O que as pessoas falam nas ruas da Jéssica? Já ouviu desabafos sobre casos de bigamia?
Sou rata de aeroporto, que é um termômetro excelente. Desde a balconista que vende café até a aeromoça, a abordagem é sempre bacana. Ouvi até uma história de uma mulher que viveu uma situação muito parecida. E, por coincidência, com um italiano. Tenho sentido as pessoas mais à vontade para falar comigo nesse trabalho.

O que você acha que mudou nessa relação?
A comédia aproxima você do público. Acho que as pessoas meio que agradecem o fato de você fazer com que elas se divirtam. E essa é a parte mais indescritível da minha profissão: a gratidão do público. Ainda mais com o núcleo de humor de uma novela. Imagino como não deve ser o retorno para os humoristas, que fazem isso o tempo todo.

Você faz questão de dizer que a Jéssica é diferente de tudo que já fez. O que esse trabalho tem que você buscava antes e não conseguia?
Na hora em que li a sinopse, não acreditei. Muita gente usa frases clichês, diz que ganhou um presente, mas acho que autor não dá presente. Ele aposta em você ou não, dá uma oportunidade. A televisão precisa ousar mais. Sempre busquei oportunidades diferentes na televisão, mas elas não vinham com frequência. Sempre tive um perfil muito parecido de personagens.

A Regina Duarte emendou uma série de mocinhas na Globo e foi intitulada a "namoradinha do Brasil" no passado. Você acha que ser filha dela imprimiu a imagem de certinha atribuída a você?
Tudo contribui. Mas eu sou uma pessoa que passa esse lado certinho. Me preocupa um pouco não ter oportunidades em função de um preconceito de pessoas que dizem "ah, ela é muito parecida com a mãe, a voz é idêntica", essas coisas. Acho lindo ser assim porque minha mãe é bonita, interessante, talentosa e, o principal, uma excelente pessoa. Mas incomoda acharem que eu sou a minha mãe. Incomodaria qualquer um. As pessoas batalham por identidade. E busco uma forma estável de vida, não sou contraditória. Poderia ser uma ¿porra-louca¿, mas quis ter uma família. Foi uma escolha conquistada e definida com terapia. E aí, de repente, isso depõe contra! Mas espero poder mudar essa ideia.

Em 21 anos de TV, essa é a sua sétima novela inteira. Essas comparações com a sua mãe afastaram você das novelas?
Sim, um pouco. Até para que eu repensasse o que queria do gênero folhetim. Novela expõe demais. Se você aparece sempre da mesma forma, não existe um ponto de mudança. Fica sempre aquele cachorro mordendo o rabo, algo retroativo. Preciso cortar esse ciclo. E é saudável parar, refletir, mudar. Parei tudo por três anos e fui ter a minha filha Manuela. Ela segurou minha onda.

Assim como você, a Regina Duarte também passou boa parte da carreira encarnando tipos certinhos. Você se espelha na carreira dela na hora de tentar direcionar sua vida para outros caminhos?
Acho que se tivesse me focado mais nisso, teria outras escolhas. Em alguns momentos poderia seguir caminhos diferentes. Não é porque somos mãe e filha que isso precisa virar uma mistureba, uma geleca. É preciso olhar para os pais de forma crítica. Seres humanos devem ter opiniões e, quando é necessário e justo, contestar. Sempre tive uma postura crítica com relação à carreira da minha mãe. Mas, durante um tempo, acho que foi confortável fazer algo que a vida estava me levando a fazer. Fizemos mãe e filha em Top Model, foi ali que começou. O Calmon (Antônio, o autor) quis fazer essa homenagem e eu não ia dizer não. Estava com 15 anos, nem pensava nisso.

Mas na época de Irmãos Coragem, você já tinha mais maturidade. Encarou com tranquilidade fazer um papel que tinha sido da sua mãe na primeira versão?
Ali já encarei de uma forma mais crítica. Tenho de dizer que fui seduzida pelo Luiz Fernando Carvalho. Ele colocou na cabeça que isso ia ser muito bom. A minha mãe é uma atriz que, na minha visão, merece todas as homenagens! Mas as homenagens acabavam me transformando em algo que me deixava em dúvida. Aquele era o caminho que eu queria ter escolhido? Vivi o auge em Por Amor. Ainda teve a abertura! Aquele selinho foi reproduzido por vários fãs depois que apareceu ali. Depois veio Chiquinha Gonzaga ...

Você acha que Passione pode ajudar você a conquistar outros perfis de personagens daqui para frente?
Sou uma atriz que precisa fazer coisas na Globo. Tenho um contrato com eles e não sou eu quem vai determinar o que eu posso ou não fazer. Foi uma sorte maravilhosa ter vindo algo diferente. E, sinceramente, espero que algumas pessoas percebam que o ator tem de fazer tudo, precisa de oportunidades de papéis distintos. Mas não sou de ficar parada, esperando trabalho. Se não pintar nada na televisão, vou me empenhar para fazer algo legal no teatro.

Passione - Globo - Segunda a sábado, às 21h.

Questão de identidade
Gabriela Duarte cresceu assistindo às novelas de sua mãe, Regina Duarte. Chegou a fazer cinema em 1983, aos 9 anos, em O Cangaceiro Trapalhão, mas apenas aos 15 anos, em 1989, estreou na TV. A primeira experiência aconteceu na Band, na minissérie Colônia Cecília. E, cerca de um mês depois, a atriz já estava confirmada no elenco de Top Model, interpretando a doce Olívia, uma das filhas do surfista quarentão Gaspar, de Nuno Leal Maia. "Eu tinha pouca idade, mas sempre aprendi a encarar com muita responsabilidade o trabalho", valorizou ela, que contracenou com Regina nesta época, já que as duas interpretaram mãe e filha.

A partir daí, Gabriela emendou três trabalhos pegando carona em suas semelhanças com a mãe. Primeiro, ao ser escalada para viver a romântica Ritinha no remake de Irmãos Coragem, em 1995. O papel foi defendido por Regina na primeira versão do folhetim. Na época, as comparações entre as duas aguçaram a vontade de Manoel Carlos de convidar a jovem atriz para protagonizar, ao lado da mãe, a novela Por Amor, em 1997, atualmente em reprise no canal por assinatura Viva. E, dois anos depois, Gabriela dividiu com Regina a função de interpretar Chiquinha Gonzaga em fases distintas da minissérie, que contou a vida da compositora. "Me incomodava imaginar que algumas pessoas só pensavam em mim quando era para trabalhar com a minha mãe ou pela minha mãe", lamentou.

Sem grandes oportunidades de mudança na TV, Gabriela conseguiu no cinema a chance que buscava para se impor como atriz. No longa O Vestido, de Paulo Thiago, encarnou a despudorada Bárbara, atuação que lhe rendeu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cinema Íbero-Americano de Huelva. "Foi uma personagem autodestrutiva. Um processo em que eu tinha de entrar e foi bem difícil de sair", lembrou.

Sensualidade comprovada
Gabriela Duarte torce para que o entusiasmo sexual de Jéssica abra espaço para fantasias na cabeça do público masculino. Em Passione, a mulher de Berillo, de Bruno Gagliasso, está sempre em cima do italiano, que nem sempre consegue acompanhar o "fogo" da dondoca. A atriz jura que, até agora, as reações dos homens são sempre contidas. "Mas vou adorar se eles começarem a brincar mais. Vai ser um sinal de que estou fazendo um bom trabalho", analisou. Gabriela não descarta, inclusive, a possibilidade de posar nua. Mas age com cautela ao falar sobre o assunto. "Acho que caberia nessa minha atual fase, mas não posso dizer que faria ou que não faria. Não existe um valor moral, só que eu já tenho uma filha e isso conta muito", desconversou. Não sem antes deixar claro que, fisicamente, se garante. "Mas não podem esperar muito tempo, porque já estou com 36 anos e, depois, não posso garantir nada", brincou ela, que já recebeu propostas no passado, mas recusou.

Trajetória televisiva
# Colônia Cecília (Band, 1989) - Bianca.
# Top Model (Globo, 1989) - Olívia.
# Irmãos Coragem (Globo, 1995) - Ritinha.
# Por Amor (Globo, 1997) - Maria Eduarda.
# Chiquinha Gonzaga (Globo, 1999) - Chiquinha Gonzaga.
# Esperança (Globo, 2002) - Justine.
# Kubanacan (Globo, 2003) - Veruska Verón (participação especial).
# América (Globo, 2005) - Simone.
# Sete Pecados (Globo, 2007) - Míriam.
# Passione (Globo, 2010) - Jéssica
fonte;terra

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